Como o ponto de torra define o sabor de um bom café

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Para se apreciar um bom café é preciso dar atenção à torra. É ela que permite ao paladar sentir as nuances e intensidade do café. Os especialistas garantem que existe um ponto ideal para a degustação que ainda não caiu no gosto dos brasileiros.

A torra tem um importante papel na hora de obter “sabores” como frutado, caramelo, amêndoa ou chocolate. Também é ela que define se a bebida será mais ou menos intensa.

“Os principais fatores que vão dar sabor ao café são os açúcares sacarose, glicose e frutose. Outro ponto são os lipídeos e proteínas. A torra vai transformando esses compostos, desenvolvendo-os para dar os aromas de café que a gente conhece como frutados, amêndoas etc. Todos esses aromas vêm da torra”, explicou o degustador de café e instrutor Jack Robson.

O café cru e em torras média e escura. — Foto: Jonatam Marinho

O degustador também fala sobre a evolução dos sabores com o tempo de torra. “Quando saímos de uma torra clara vamos gradativamente aumentando a doçura ou percepção dessa doçura. Começa de um caramelo ou açúcar caramelizado, ou caramelizado mais forte e vira um caramelo tipo doce de leite. Depois, segue para um chocolate, chocolate amargo e chocolate 100%. Até chegar nos níveis de carbonizar esse açúcar e os outros componentes do café”, detalhou.

É preciso ter muito cuidado para não passar do ponto certo.

“Uma torra escura não significa uma torra queimada, mas pode ter a possibilidade de aparecer sabores queimados sim. Vale lembrar ainda que intensidade não é qualidade.”, acrescentou Jack.

Para o especialista em cafés especiais da Cooperativa Agrária de Machado (Coopama) Kevin Mai, o ponto de torra influência totalmente no sabor do café. “Quando não se faz uma torra perfeita você perde totalmente os atributos do café”, alertou.

Tipos de torra

Um café com ponto de torra mais claro terá sabor menos intenso. Esse é o café vendido como especial. “Café mais claro tem um sabor menos intenso e, dependendo da matéria prima, pode ser mais ácido ou mais doce”, explicou Jack.

A torra média seria o ponto ideal para aproveitar as qualidades do grão. É o chamado café gourmet. “A torra média ideal é aquela que pode destacar todas as qualidades do grão. Aquele café que apresenta tanto doçura como acidez em um corpo bem equilibrado”, continuou Jack.

Kevin Mai apresenta os pontos de torra e o que seria o ideal para saborear o café. — Foto: Divulgação / Coopama

E, por fim, ele falou também sobre os cafés fortes e extrafortes ou de torra escura que vão apresentar um sabor acentuado e mais forte. “É errado o consumidor interpretar que torra escura é sinal de café encorpado. O corpo do café é o quanto ele preenche sua boca. As torras escuras deixam mais um sensação de queimado, de intensidade de sabor desagradável na boca do que corpo propriamente dito. O café precisa dos óleos, um pouquinho da parte fibrosa e açúcares que ajudam na questão do corpo do café”, finalizou Jack.

Sobre o café tradicional ou normal, Kenin explicou que o ponto de torra varia conforme a marca, ficando no médio ou escuro.

Hábitos

Para Kevin Mai, o brasileiro não consegue preparar o café de uma forma correta e que valorize as qualidades da bebida. “O método que o brasileiro faz o café não é o mais indicado. Existe uma temperatura certa para a água e uma quantidade de pó ideal”.

Segundo o especialista da Coopama, o brasileiro gosta de café forte e com bastante açúcar. Por conta desses hábitos, para tomar uma bebida especial é preciso ir a uma cafeteria com barista. “Esse profissional usará o método certo conseguir apresentar o sabor correto daqueles grãos. A torra perfeita e o método perfeito de preparação: essa é a vantagem do barista”, emendou.

O degustador e instrutor Jack Robson. — Foto: Ana Lúcia Pressato Silva

Jack lembrou que o Sul de Minas já possui cafeterias que permitem apreciar um bom café. Fora desses estabelecimentos, fica difícil tomar uma boa bebida porque as pessoas não costumam buscar cafés especiais. Mesmo assim, nos supermercados existem bons grãos disponíveis. “Os pacotes de café trazem informações sobre o ponto de torrefação. Também há o selo de gourmet da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café) ou os especiais da Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) que já possuem torra de clara a média por serem especiais”, contou.

Mas, para Kevin Mai, os mais comum é comprar os cafés mais simples. “Mudar hábitos é muito difícil porque os melhores grãos têm preços mais altos. Os produtos mais baratos nos supermercados costumam não ser cafés especiais”, disse.

Antes da torra

Cuidados anteriores a torra de café são fundamentais para ter uma boa matéria-prima para a torra. O que vai definir o sabor da bebida são os cuidados com o grão no pós-colheita. Jack cita que a influência do sabor ocorre em processos básicos do processamento como, por exemplo, se o café foi lavado ou não, presença de frutos verdes, se foi despolpado e se o fruto foi seco com casca ou sem casca em secador, terreiro ou terreiro suspenso.

Robson ainda alertou que, para uma boa bebida, é melhor colher os frutos mais maduros ou então fazer uma separação. Também disse que é preciso realizar o manejo de pós-colheita bem feito. “Cada etapa de processamento deve ser feita dentro das técnicas. Tomar cuidado com as temperaturas altas na secagem, altura da leiras etc”.

Prateleiras de supermercados oferecem opções para todos os gostos. — Foto: Jonatam Marinho

O passo a passo para um bom café em casa
O especialista em cafés especiais da Cooperativa Agrária de Machado (Coopama) Kevin Mai dá dicas para se fazer e apreciar um bom café em casa:

1 – Escolher um café de preferência, com uma moagem não muito fina ou grossa, com uma textura de açúcar cristal.

2 – Usar a proporção de 1 grama de café para cada 10 ml de água ou 15 ml. Deve-se observar a torra “Quanto mais escura a torra, menos pó deve ser colocado”, alertou.

3 – Para fazer um bom café deve-se usar água sempre filtrada para evitar que o cloro ou outras substâncias interfiram no sabor da bebida.

4 – É importante experimentar café sem açúcar. “O gosto do açúcar pode atrapalhar sentir o sabor de um bom café”, afirmou.

5 – Não se deve ferver o café junto com água. “Isso pode tirar os sabor do café”, disse. O ideal é usar água a 96 graus.

6 – Antes de usar o coador de pano é preciso fervê-lo para tirar qualquer gosto que possa estar presente. Mas, se o coador for de papel, a dica é passar água quente primeiro. Essa água deve ser descartada e só depois o café pode ser passado.

Fonte: G1 Sul de Minas – Coluna Grão Sagrado (Por Jonatam Marinho)